A lobotomia
Em muitos casos, a lobotomia ou transformava os pacientes em vegetais ou simplesmente tornava-os mais dóceis, passivos e fáceis de controlar (menos inteligentes também). Muitos médicos viam isso como um "bom progresso", porque eles não sabiam outras formas de tratar pacientes com doenças mentais.
À época, facto do paciente perder a capacidade motora e de fala, ter constantes convulsões ou qualquer outro dano cerebral, era considerado apenas um efeito colateral negativo do tratamento.
Apesar de Egas Moniz defender o uso da lobotomia apenas em casos graves, como em risco de suicídio, Walter Freeman praticou este tipo de cirurgia excessivamente nos Estados Unidos. O mesmo chegava a promover a lobotomia como uma cura para tudo, desde doenças mentais graves a depressão pós-parto e fortes dores de cabeça, dor crônica, indigestão nervosa, insônia e dificuldades comportamentais.
Este neurologista viajava durante longas temporadas fazendo lobotomias no seu "lobotomóvel", no fim, ele realizou 3 mil lobotomias nos EUA, chegando a fazer 20 num único dia.
Descobriu-se que Walter Freeman, que inicialmente alegava uma taxa de sucesso de 85%, tinha, na verdade, uma taxa de mortalidade de 15%. E quando os médicos investigaram os resultados de longo prazo dos seus pacientes, eles descobriram que apenas um terço tinha melhorado, enquanto outro terço estava significativamente pior.
Pacientes de Freeman
Apaciente mais famosa de Freeman é Rosemary Kennedy, irmã do ex-presidente John F. Kennedy. Após Rosemary apresentar alguns comportamentos violentos e rebeldes, o seu pai Joseph autorizou que Rosemary fose lobotomizada aos 23 anos. Contudo, depois da cirurgia, Rosemary nunca mais conseguiu mais andar ou falar. Durante a maior parte do tempo a sua existência foi um segredo, pois ela passou o resto da sua vida escondida em instituições, necessitando de cuidados em tempo integral.
Outro paciente foi o menino de 12 anos Howard Dully, autor do livro My Lobotomy. Dully era um menino rebelde e comum, contudo, seus comportamentos incomodavam a sua madrasta. Em 16 de dezembro de 1960 a mesma agendara-lhe uma lobotomia.
Mesmo sendo um dos pacientes mais jovens a passar por uma lobotomia, o então menino sobreviveu sem sequelas, algo extremamente raro. O norte-americano nunca apresentou lentidão na fala, problemas nos olhos, falta de inibição social, nem perdeu o movimento das pernas. Howard milagrosamente ficou bem para contar a história e, mesmo após tantos anos, ele ainda se lembra bem do dia da cirurgia.
"Eles levantaram o olho e foram até o canto, acertaram e sacudiram com essa coisa que parece um batedor de ovos".
"É uma loucura para mim. Quer dizer, estamos a falar de um cérebro. Não deveria haver alguma precisão envolvida?
O mesmo conta que após a cirurgia sentiu os olhos inchados e doridos, além de ter sofrido com febre alta. Mentalmente sentia-se como um zombie e nem entendia bem o que lhe tinha acontecido.
"Tentei reconstruir minha vida. Levei muito tempo. Tive muitos problemas quando era um jovem adulto: drogas, álcool e atividades criminosas, tentando roubar e ganhar dinheiro, vencer na vida, então não foi fácil."
Dully que tenta evitar pensar em como sua vida poderia ter sido diferente se ele não tivesse se submetido ao procedimento, por medo de ser dominado pela raiva.
Este tratamento perdeu popularidade na década de 50, à medida que a população gamhou maior consciência dos seus efeitos colaterais. As críticas à lobotomia também cresceram entre os profissionais da medicina, que denunciavam negligências, uma vez que boa parte dos médicos que realizavam o procedimento não era formado por neurocirurgiões.
Foi também nesta época que os cientistas desenvolveram medicamentos psicoterapêuticos, muito mais eficazes e seguros no tratamento de transtornos mentais do que a lobotomia. Em 1960, o psiquiatra italiano Franco Basaglia revolucionou o tratamento relacionado a transtornos mentais, investindo uma abordagem de reinserção territorial e cultural do paciente na comunidade, em vez de isolá-lo num manicômio à base de fortes medicações, vigilância ininterrupta, choques elétricos e camisas de força.
Atualmente as lobotomias ainda são realizadas em casos especiais, embora com outro tipo de cuidados. A remoção de áreas cerebrais específicas é reservada para o tratamento de pacientes para os quais todos os outros tratamentos falharam.
De acordo com um estudo publicado em 2005 no jornal Brain Research Reviews, atualmente a cirurgia é feita de modo preciso e visa apenas a parte do tecido cerebral que causa os sintomas problemáticos nas pessoas.
Uma dessas cirurgias cerebrais é conhecida como cingulotomia, que é usada para tratar pessoas com transtorno obsessivo-compulsivo grave.
Várias são as mídias que apresentaram esta cirurgia, a grande maioria através de um olhar negativo. Um exemplo é a série da Netflix "Ratched" que retrata um processo sádico que ataca vulneráveis e deixa pacientes em estado vegetativo.
Achei este tema bastante interessante de aprender e pesquisar sobre, contudo é difícil não me revoltar enquanto leio sobre os efeitos colaterais dos pacientes e a forma como isso afetou as suas vidas.